segunda-feira, 27 de julho de 2009

Esperando por maluquecimentos....


Já há muito tempo que não acontece nada diferente por aqui. Infelizmente, as notícias do senado já não assustam mais, a gripe suína já perdeu seu ar de terror e os jornais locais voltaram a fazer reportagens sobre problemas no trânsito. Enfim, a vida volta ao normal quando tudo o que a compõe se torna banal. Quando determinado grupo já não chama mais a atenção, quando a corrupção se torna cotidiana e quando a guerra fica distante o suficiente pra não lembrarmos mais das vidas que findam (as guerras em outro país e as internas também). Enfim, a vida segue em seus moldes clássicos e rotineiros. Traz muito conforto. Conforto até demais. Acomoda.
Já seria um preço alto a ser pago por estarmos assim (digo “estarmos” enquanto coletivo, porque individualmente há casos que diferenciam), mas o mais incrível é o preço que impomos para que todos permaneçam nesta “ordem”. Daí o diferente incomoda o suficiente para que um sujeito, ou um grupo, sinta-se à vontade para denegrir, ofender, bater e até matar.
Necessitamos de novos maluquecimentos! Maluquecimentos legítimos, que permitam a felicidade. Não é possível que ainda não sejamos capazes de conseguir a felicidade individual com a consciência de que pra alcançar esta felicidade não é necessário prejudicar outrem. Seria simplesmente permitir o simples. Viver o simples. Às vezes, deixar todas as justificativas, os motivos, as razões e dar um passo adiante é uma questão de escolha, uma escolha que pode ser mais simples do que se imagina. Oponho-me à psicologização, à necessidade de se ter sempre motivos e se apegar à eles e não caminhar. O apego é também uma escolha, e em alguns casos, o simples fato de tomar a decisão é o caminho. Sem problematizações. Ok, cada um no seu tempo, respeito isso. Mas o alerta é para termos mais atenção sobre o que precisa demandar tempo, energia, envolvimento e o que não, o que pode ser simples.
Infelizmente, ser simples (por favor, não confundam simplicidade com vida pobre. Engraçado como o até “vida humilde” tornou-se pejorativo, algo que deveria ser tão bom, uma postura de vida) tornou-se o diferente, e há um preço a se pagar por essa opção. Bancar decisões, fazer diferente para ser feliz, “maluquecer”. Garanto que é um preço que vale a pena e que os resultados influenciarão outros a tomarem suas vidas em suas mãos, pois distinguir o que é melhor pra si diferenciando-se do que é melhor pra todos é também responsabilizar-se por sua própria felicidade e que o resultado não pode ser pior que o que já vivenciamos, não dá pra cavar mais este poço.

sexta-feira, 17 de julho de 2009

A casa

Passou pela porta de entrada e foi como se já fizesse muito tempo desde que esteve ali pela última vez. Com o passar dos dias, semanas, meses (já não sabia mais, tinha perdido a noção de quanto tempo) as coisas foram tornando-se empoeiradas: as cadeiras, os vasos, o sofá, o que tornava aquele lugar familiar. Passou, passaram despercebidos. Os porta-retratos indicavam que alguém ali já tinha sido feliz, um casal, uma família que existiu. Ainda existe? Ainda existe. Mesmo sem saber o porquê, essa resposta parece ser a única, ainda que não lhe traga conforto. Caminha por ali, cansado, chegando do trabalho. Observa em silêncio. O descuido do dia-a-dia fez com que chegasse a este ponto de distanciamento. Não sente-se a vontade para sentar-se ali. Não enxerga mais. Não sente-se a vontade pra dizer à sua esposa, ali, no sofá, aquele “eu te amo”. Amor estampado agora encoberto. Esposa. Tanta intimidade. Conhece aquele corpo, o toque, mas não mais os sentimentos. Não mais seus sentimentos. Percebendo neste momento tudo que rodeia esta casa, reconhecendo num olhar atendo à TV um brilho singelo que há muito não percebia (não que não estivesse ali, mas que realmente não foi percebido)e que o toca, tomado por uma motivação estranhamente adormecida que lembra- se ter possuído no princípio de tudo, de súbito seu olhar se levanta e solta como quem fez uma grande descoberta, deixando Maria agitada: “Maria, levanta deste sofá!Está na hora de arrumarmos a casa.”